segunda-feira, 26 de agosto de 2013




Deitada, dispersa delicadamente em meio aos lençóis amarrotados. O tecido branco do travesseiro em contato com seus olhos semiabertos, num sono que emana uma leveza de uma vida estável – mas não aquela estabilidade pacata e entediante, mas uma que acabara de se criar naquele momento. A manhã chega e o quarto está sujo. O sol invade e revela um cheiro peculiar. Cinzas e marcas redondas no assoalho de madeira, copos vazios da bebida da noite anterior. Uma noite de suores e agressividade, numa profanidade que não lhe é característica, mas que fluiu assim que sua sobriedade se esvaía. Enquanto a fito atentamente, penso no que dirá quando acordar. Talvez esteja arrependida, pensando que agiu levianamente e queira ir embora, sem trocar muitas palavras. Talvez abrirá os olhos lentamente e possuir-me-á de novo, só que desta vez de uma maneira tênue, envolvida ainda pelo leve sono da manhã quente. Sentirei seu gosto doce e me deliciarei com avidez, pois que tem uma essência particularmente encantadora. Ou talvez ela simplesmente não lembre do que vivemos. Continuo a olhá-la, tentando sorver sua alma naqueles instantes longos que se passam. Seu corpo despido me deslumbra, mas nunca saberei se poderei encontrá-lo novamente. Tudo que se criou aqui foram fantasias, confabulações da minha psique que não se sacia em viver o momento fugaz a que tantos se propõem sem grandes preocupações. Eu não. Eu racionalizo. Eu crio milhares de finais para o que  gostaria que não tivesse fim. E se ela nada dizer? O que farei eu deste apaixonamento? Não, ela não faria isso. Se entregara antes em palavras e toques sem medida, tão intensamente quanto pôde e como lhe é peculiar. Se for embora para sempre, posso apenas dizer que não esquecerei seu sorriso, nem suas mãos – inicialmente tímidas – ao me tocarem. Poderia casar-me com ela, e teríamos filhos lindos – inquietos como eu, mas lindos como ela. Ela riria-se do meu pedido, mas aceitaria sem muita hesitação. E o que faço do presente? O que ela espera que eu diga quando acorde? Não sei o que dizer, mas senti reciprocidade nos seus olhos ontem à noite, uma sensação de que ela sabia o que eu pensava, e pensava o mesmo. Seus olhos diziam muito, dessa sensação de plenitude momentânea que vivíamos ali, de algo que não era fugaz, por mais que a conhecesse há apenas algumas horas. Melhor esperar e ver como ela reage, quem sabe assim saberei o que  dizer, ou como tocar-lhe. Um beijo lento e macio foi a última coisa que partilhamos antes de dormir. Sentirei saudades desse beijo. Assim que me abandonar, procurarei em outra o que aqueles olhos me disseram, mas quem pode dizer que encontrarei tão cedo? Ela vai embora. Tenho certeza. Ela vai embora. Como todas as outras também foram. Vai deixar para trás apenas seu cheiro em minha cama. Ainda sinto o gosto de seu beijo na minha boca. E essas serão as únicas lembranças que restarão do meu sonho criado. Ela não irá me ligar, e, quando me ver, cumprimentar-me-á com um sorriso vazio, como se nunca tivéssemos vivido aquela noite. E assim ela se tornará apenas mais uma experiência que passou, mais uma memória, e ela nunca mais voltará por aquela porta. O que dizer agora? Ela está acordando...

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