terça-feira, 27 de agosto de 2013




Luana amava Patrícia, mais que Patrícia amava Luana. Luana tinha os cabelos curtos e negros, um sorriso inocente no rosto, acreditava em amor para sempre e usava roupas ora femininas, ora meio infantis. Patrícia tinha os cabelos longos e mais claros, adorava ficar em casa com uma blusa cinza grande e meio caída, de tecido fino e apenas de calcinha - adorava especialmente aquela calcinha amarela clara, que parecia um pequeno short. Tinha os seios grandes, mas bonitos. Patrícia não gostava de tomar café da manhã, e não acreditava em casamento. Luana se apaixonara intensamente por Patrícia, que, inicialmente, não correspondia, apenas aproveitava seu sexo e as noites divertidas que tinham juntas. Com o passar do tempo, Patrícia convenceu-se de que gostava de Luana também, e foi assim por longos meses. Luana sempre se jogava em suas relações, desde o início. Patrícia era sempre cautelosa, pensava controlar o que sentia. No fim das contas, mesmo que em ritmos diferentes, alcançaram alguma paridade. Já haviam se acostumado uma com a outra, com o gosto de uma e de outra. Era de um cotidiano previsível, mas agradável. Num dia, sem muitos precedentes, Luana comprou um acessório e pediu para que Patrícia lhe penetrasse. Patrícia assustou-se. É verdade que não estava acostumada a ser passiva em suas experiências, mas vestir aquele pinto de borracha era muito para ela. Ficou incomodada e disse que não faria isso. Luana insistia para que Patrícia lhe comesse. Patrícia recusou-se e não conseguia entender porque aquilo era necessário. Luana não sabia explicar, mas recentemente esse desejo lhe consumia como nada a consumira há tempo. Era quase uma fissura, de ter aquilo dentro dela. As duas ficaram alguns dias trocando olhares fugidios, sem saber o que fazer daquilo. Luana não entendia que uma mudança de postura assim, era muito a se pedir. Patrícia nunca soubera agir desta forma, não submetia-se a uma sexualidade diferente da que já estava acostumada. Podia ser por medo, podia ser por segurança de fazer tudo como aprendera um dia e como sempre havia feito - afinal, havia dado certo deste modo, até aquele preciso momento. Pedir para mudar era um passo maior do que Patrícia podia dar. Luana entendeu sua reação como uma prova de que Patrícia nunca a amara de verdade. Para Luana, Patrícia tinha complicado coisas que eram simples demais - que para ela eram simples demais. Não conseguia entender o que havia de tão difícil nisso. Patrícia, por sua vez, não compreendia de onde surgia aquele desejo insaciável, não entendia porque para ela já estava tudo completo, mas para Luana não. O encantamento que tinham uma pela outra parecia dissipar-se. Depois de alguns dias, Luana apenas juntara suas coisas e voltara para casa de sua mãe, sem nada dizer a Patrícia.

segunda-feira, 26 de agosto de 2013




Deitada, dispersa delicadamente em meio aos lençóis amarrotados. O tecido branco do travesseiro em contato com seus olhos semiabertos, num sono que emana uma leveza de uma vida estável – mas não aquela estabilidade pacata e entediante, mas uma que acabara de se criar naquele momento. A manhã chega e o quarto está sujo. O sol invade e revela um cheiro peculiar. Cinzas e marcas redondas no assoalho de madeira, copos vazios da bebida da noite anterior. Uma noite de suores e agressividade, numa profanidade que não lhe é característica, mas que fluiu assim que sua sobriedade se esvaía. Enquanto a fito atentamente, penso no que dirá quando acordar. Talvez esteja arrependida, pensando que agiu levianamente e queira ir embora, sem trocar muitas palavras. Talvez abrirá os olhos lentamente e possuir-me-á de novo, só que desta vez de uma maneira tênue, envolvida ainda pelo leve sono da manhã quente. Sentirei seu gosto doce e me deliciarei com avidez, pois que tem uma essência particularmente encantadora. Ou talvez ela simplesmente não lembre do que vivemos. Continuo a olhá-la, tentando sorver sua alma naqueles instantes longos que se passam. Seu corpo despido me deslumbra, mas nunca saberei se poderei encontrá-lo novamente. Tudo que se criou aqui foram fantasias, confabulações da minha psique que não se sacia em viver o momento fugaz a que tantos se propõem sem grandes preocupações. Eu não. Eu racionalizo. Eu crio milhares de finais para o que  gostaria que não tivesse fim. E se ela nada dizer? O que farei eu deste apaixonamento? Não, ela não faria isso. Se entregara antes em palavras e toques sem medida, tão intensamente quanto pôde e como lhe é peculiar. Se for embora para sempre, posso apenas dizer que não esquecerei seu sorriso, nem suas mãos – inicialmente tímidas – ao me tocarem. Poderia casar-me com ela, e teríamos filhos lindos – inquietos como eu, mas lindos como ela. Ela riria-se do meu pedido, mas aceitaria sem muita hesitação. E o que faço do presente? O que ela espera que eu diga quando acorde? Não sei o que dizer, mas senti reciprocidade nos seus olhos ontem à noite, uma sensação de que ela sabia o que eu pensava, e pensava o mesmo. Seus olhos diziam muito, dessa sensação de plenitude momentânea que vivíamos ali, de algo que não era fugaz, por mais que a conhecesse há apenas algumas horas. Melhor esperar e ver como ela reage, quem sabe assim saberei o que  dizer, ou como tocar-lhe. Um beijo lento e macio foi a última coisa que partilhamos antes de dormir. Sentirei saudades desse beijo. Assim que me abandonar, procurarei em outra o que aqueles olhos me disseram, mas quem pode dizer que encontrarei tão cedo? Ela vai embora. Tenho certeza. Ela vai embora. Como todas as outras também foram. Vai deixar para trás apenas seu cheiro em minha cama. Ainda sinto o gosto de seu beijo na minha boca. E essas serão as únicas lembranças que restarão do meu sonho criado. Ela não irá me ligar, e, quando me ver, cumprimentar-me-á com um sorriso vazio, como se nunca tivéssemos vivido aquela noite. E assim ela se tornará apenas mais uma experiência que passou, mais uma memória, e ela nunca mais voltará por aquela porta. O que dizer agora? Ela está acordando...

segunda-feira, 12 de agosto de 2013



sometimes i see myself floating
to damn high
letting be guided by the cool air of a summer breeze
but the seasons come and go
and still
i dive carelessly
catch my breath
and let myself drown later
but that's ok
it's worth the road
it's worth that weightlessness in my head
that temporarily eases my soul
for each dive, a new lesson
a new memory.


terça-feira, 6 de agosto de 2013



transferência que engole
contratransferência que vomita
restos de um self mal digerido
pedaços inteiros
jorrados 
caídos
desconforto
ainda morno
escorre
sem contenção
pelo canto da boca
num mal estar sem alvo
uma doença sem nome.